O Chimarrão é um legado do índio Guarani
Sempre presente no dia-a-dia, o chimarrão constituiu-se na bebida típica do Rio Grande do Sul, ou seja, na tradição representativa do nosso pago. Também conhecido como mate amargo, como bebida preferida pelo gaúcho, constitui-se no símbolo da hospitalidade e da amizade do gaúcho. É o mate cevado sem açúcar, preparado em uma cuia e sorvido através de uma bomba. É a bebida proveniente da infusão da erva-mate, planta nativa das matas sul-americanas, inclusive no Rio Grande do Sul.
O homem branco, ao chegar no pago gaúcho, encontrou o índio guarani tomando o CAA, em porongo, sorvendo o CAÁ-Y, através do TACUAPI.
Podemos dizer, que o chimarrão é a inspiração do aconchego, é o espírito democrático, é o costume que, de mão – em - mão, mantém acesa a chama da tradição e do afeto, que habita os ranchos, os galpões dos mais longínquos rincões do pago do sul, chegando a ser o maior veículo de comunicação.
O mate é a voz quíchua, que designa a cuia, isto é, o recipiente para a infusão do mate. Atualmente, por extensão passou a designar o conjunto da cuia, erva-mate e bomba, isto é, o mate pronto.
O homem do campo passou o hábito para a cidade, até consagrá-lo regional. O Chimarrão é um hábito, uma tradição, uma espécie de resistência cultural espontânea.
Os avios ou os apetrechos do mate constituem o conjunto de utensílios usados para fazer o mate. Os avios do mate são fundamentalmente a cuia e a bomba.
A CUIA NOVA
Quando a cuia é nova, é necessário curti-la antes de começar a matear. Para tal, é necessário enchê-la de erva-mate pura ou ainda misturada com cinza vegetal e água quente, que deve permanecer de dois a três dias, mantendo a umidade, para que fique bem curtida, impregnando o gosto da erva em suas paredes. O uso da cinza é para dar maior resistência ao porongo. Após o tempo determinado, retira-se a erva da cuia e, com uma colher, raspa-se bem o porongo, para retirar alguns baraços que tenham ficado.
VOCABULÁRIO
Caá = erva-mate
Caá-y = bebida do mate = chimarrão
Tacuapi= bomba primitiva, feita de taquara pelos índios guaranis.
O MATE E A SUA INTIMIDADE
O ato de preparar um mate diz-se: “cevar um mate” ou “fechar um mate”, ou “fazer um mate” ou ainda ”enfrenar um mate”. A palavra amargo é muito usada em lugar de mate ou chimarrão. O convite para tomar um mate é feito das seguintes formas:
Vamos matear?
Vamos gervear?
Vamos chimarrear?
Vamos verdear?
Vamos amarguear?
Vamos apertar um mate?
Vamos tomar um chimarrão?
Vamos tomar mate ou um mate
Que tal um mate?
EM RELAÇÃO A COMPANHIA, O MATE PODE SER TOMADO DE TRÊS MANEIRAS:
MATE SOLITO : quando não precisa de estímulo maior para matear, a não ser a sua própria vontade. É o verdadeiro mateador.
MATE DE PARCERIA : quando se espera por um ou mais companheiros para matear a fim de motivar o mate, pois não gosta de matear sozinho.
RODA DE MATE: é na roda de mate, que esta tradição assume seu apogeu, agrupando pessoas sem distinção de raça, credo, cor ou posse material. Irmanados num clima de respeito, o mate integra gerações numa trança de usos e costumes, que floresce na intimidade gaúcha.
CHIMARRÃO É RICO EM POESIA
Antigamente, Quando os namoros eram de longe, através de troca de olhares, os apaixonados utilizavam o mate como meio de comunicação e, de acordo com o que era posto na cuia, a mensagem era recebida e interpretada. Ao longo de sua história, o chimarrão é utilizado como veículo sutil de comunicação com objetivos sentimentais.
Atualmente, os costumes mudaram, mas o hábito do chimarrão permanece cada vez mais forte, caracterizando o povo gaúcho.
SIGNIFICADO DOS MATES
* Mate com açúcar: quero a tua amizade
* Mate com açúcar queimado: és simpático
* Mate com canela: só penso em ti
* Mate com casca de laranja: vem buscar-me
* Mate com mel: quero casar contigo
* Mate frio: desprezo-te
* Mate lavado: vai tomar mate em outra casa
* Mate enchido pelo bico da bomba: vás embora
* Mate muito amargo (redomão): chegaste tarde, já tenho outro amor
* Mate com sal: não apareças mais aqui
* Mate muito longo: a erva está acabando
* Mate curto: pode prosear a vontade
* Mate servido com a mão esquerda: você não é bem vindo
* Mate doce: simpatia
A LENDA DA ERVA MATE
Contam que um guerreiro guarani, que pela velhice não podia mais sair para as guerras, nem para a caça e pesca, porque suas pernas trôpegas não mais o levavam, vivia triste em sua cabana. Era cuidado por sua filha, uma bela índia chamada Yari, que o tratava com imenso carinho, conservando - se solteira, para melhor se dedicar ao pai.
Um dia, o velho guerreiro e sua filha receberam a visita de um viajante, que foi muito bem tratado por eles. À noite, a bela jovem cantou um canto suave e triste para que o visitante adormecesse e tivesse um bom descanso e o melhor dos sonos.
Ao amanhecer, antes de recomeçar a caminhada, o viajante confessou ser enviado de Tupã, e para retribuir o bom trato recebido, perguntou aos seus hospedeiros o que eles desejavam, e que qualquer pedido seria atendido, fosse qual fosse.
O velho guerreiro, lembrando que a filha, por amor a ele, para melhor cuidá-lo, não se casava apesar de muito bonita e disputada pelos jovens guerreiros da tribo, pediu algo que lhe devolvesse as forças, para que Yari, livre de seu encargo afetivo, pudesse casar.
O mensageiro de Tupã entregou ao velho um galho de árvores de Caá e ensinou a preparar a infusão, que lhe devolveria as forças e o vigor, e transformou Yari em deusa dos ervais, protetora da raça guarani.
A jovem passou a chamar-se Caá-Yari, a deusa da erva-mate, e a erva passou a ser usada por todos os componentes da tribo, que se tornaram mais fortes, valentes e alegres.
ALGUNS DIZERES
O primeiro mate é dos pintos . - como o gaúcho atira fora os primeiros sorvos de mate, serão os pintos os aproveitadores das partículas de erva cuspidas.
O mate pra o estribo ou O mate o mate do estribo . O último mate com que se brinda um visitante, quando ele já está “com pé no estribo”, ou seja, pronto para partir.
Como o mate do João Cardoso . Emprega-se para designar um fato que nunca se realiza, uma promessa que nunca se cumpre.
Como o mate das senhoras Morais . Idêntico significado da frase anterior. As senhoras Morais, residente na povoação de Basílio, no município de Herval, quando recebiam visitas passavam a tarde inteira perguntando se os amigos queriam mate doce ou chimarrão, com erva paraguaia ou brasileira, em cuia de porcelana ou porongo... para, no final, nada oferecerem.
Toma mais um mate. Não te vás, é cedo ainda.
Aquentar a água pra outro tomar mate. Preparar um negócio para outro pessoa colher os lucros. Emprega-se de modo especial para designar um namorado que “prepara uma moça para depois outro casar com ela...
A “erva”. O dinheiro.
Ele se encheu de “erva”. Ele ganhou muito dinheiro. Talvez um vestígio do tempo em que a erva supria a ausência de moedas sonantes.
Nem pra erva. No último grau de pobreza. Sem dinheiro se quer para comprar o artigo de primeiríssima necessidade quotidiana, que é a erva-mate.
OS DEZ MANDAMENTOS DO CHIMARRÃO
1º - Não peças açúcar no mate.
2º - Não digas que o chimarrão é anti-higiênico.
3º - Não digas que o mate está quente demais.
4º - Não deixes um mate pela metade.
5º - Não te envergonhes do ronco do mate.
6º - Não mexas na bomba.
7º - Não alteres a ordem em que o mate é sorvido.
8º - Não durmas com a cuia na mão.
9º - Não condenes o dono da casa por tomar o primeiro mate.
10º - Não digas que o chimarrão dá câncer na garganta.
FAGUNDES , Glênio - Cevando o Mate
LESSA , Luiz Carlos Barbosa - História do Chimarrão
TUBINO, Wilson - Os Mistérios Ocultos do Chimarrão
TEIXEIRA , Luiz Rotilli - A Importância Social do Chimarrão
BERKAI, Dorival e BRAGA, Clóvis Airton - 500 Anos de História de Erva-mate
RIBEIRO , Paula Simon - Folclore: Aplicação Pedagógica
FAGUNDES, Antonio Augusto - Curso de Tradicionalismo Gaúcho
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