Uma língua não é falada de maneira idêntica pelos seus usuários. Não sendo uniforme, podemos observar inúmeras variações se compararmos, por exemplo, a expressão de gaúchos, pernambucanos, cariocas, mineiros e paulistas. Essas variações são, entre outras, principalmente de natureza fonética (o que chamamos de sotaque), lexicais (emprego de palavras e expressões próprias) e sintáticas (ordem das palavras na oração, regência, concordância, etc.)
Além das variações regionais, a língua varia conforme a época, a classe social, o nível de instrução, a faixa etária, a situação de comunicação, etc.
Portanto as variações linguísticas são decorrentes:
a) Do falante: variedades relacionadas à região onde se nasce, ao meio social em que se é criado ou se vive, à profissão que se exerce, à faixa etária e ao momento histórico.
b) Da situação: variedades que ocorrem em função do interlocutor, do tipo de mensagem e do momento ou contexto.
Um advogado, por exemplo, faz diferentes usos da língua ao conversar com um colega de profissão, ao dirigir-se a um juiz no tribunal, ao redigir um bilhete para a secretária ou os argumentos de defesa de um réu. A esses tipos de variedades dá-se o nome de registros.
Tanto na linguagem oral quanto na linguagem escrita, podemos observar diversos graus de formalidade, do mais informal ao mais formal.
Estou preocupado. (norma culta)
Tô preocupado. (língua popular, coloquial)
Tô grilado. (gíria, limite da língua popular)
Não é a mesma coisa falar para dezenas de pessoas em um auditório e contar algo a um amigo. Tampouco é a mesma coisa falar com um irmão e falar com o prefeito da cidade. Cada um desses momentos é uma situação comunicativa diferente. Variam não só as pessoas, mas o lugar, o momento, o(s) receptor(es), as relações afetivas e o tema do qual se fala (a partida de futebol, a suspensão do aluno, etc.)
Registro é como chamamos a variante linguística condicionada pelo grau de formalidade existente na situação em que se dá o ato da fala, ou da finalidade, no ato da escrita.
Observe diferentes registros:
O professor, seguidor fiel dos regulamentos, não permitirá nenhum desvio de conduta dos alunos. (formal)
O professor é rigoroso e não vai permitir nenhuma desordem dos alunos. (informal)
O professor é ligadão na disciplina e não vai dar colher de chá aos alunos. (muito informal)
Gíria , jargão e calão
A gíria e o jargão são códigos linguísticos próprios de um grupo sociocultural ou profissional, com vocabulário especial, difícil de compreender ou incompreensível para os não-iniciados. Um médico ao explicar um procedimento cirúrgico, um economista ao explicar a desvalorização da moeda ou um advogado ao explicar procedimentos e argumentações jurídicas empregam jargões próprios da sua profissão. Marginais do tráfico de drogas, surfistas, grupos de rap e policiais, por exemplo, empregam gírias que os identificam e contribuem para a coesão do grupo. As fronteiras entre a gíria e o jargão não são, algumas vezes, bem delimitadas.
Linguagem Técnica: Você está com escabiose.
Linguagem coloquial: Ex.: Você está com sarna.
O calão (ou baixo calão) é uma realização linguística caracterizada pelo uso de termos baixos, grosseiros ou obscenos, que, dependendo do contexto, muitas vezes chocam a falta de decoro e desvalorizam socialmente aqueles que o empregam.
As variedades linguísticas
Qualquer criança aprende a usar uma língua de forma rápida, espontânea e inconsciente. Portanto, o uso oral da língua independe de qualquer escolarização. Entretanto, essa capacidade se restringe a situações informais do cotidiano. O papel da escola é transmitir padrões referentes ao uso da escrita e da fala em situações formais, sem esquecer, contudo, as variedades históricas, regionais, sociais e outras, como as condicionadas pelo grau de escolaridade, pela faixa etária, pelo momento, pela situação, etc.
Esse padrões referem-se ao uso da norma de maior prestígio sociocultural, isto é, a norma culta ou norma padrão.
Culta ou padrão é a língua veiculada nos dicionários, nas gramáticas, nos textos literários, técnico-científicos e jornalísticos, e na redação dos documentos oficiais do país.
Portanto, não se pode usar exclusivamente a língua escrita com finalidades de criação literária como modelo de língua padrão. Além disso, seria mais apropriado falarmos em variedades cultas, já que um brasileiro culto nascido e criado em uma região não vai falar exatamente igual a um brasileiro culto nascido e criado em outra. Além disso, outras diferenças, como a faixa etária ou a profissão, por exemplo, podem determinar outras características.
O preconceito linguístico
Afirmar que alguém não sabe falar corretamente porque não utiliza a variedade de maior prestígio é desconhecer a diversidade linguística brasileira. O que se pode questionar é a adequação da fala à situação de comunicação. Os membros das variadas comunidades linguísticas, distribuídas por regiões ou grupos sociais, comunicam-se e são compreendidos utilizando a norma da sua comunidade.
Para que se possa ensinar a variedade de maior prestígio, é fundamental que a escola respeite a modalidade de língua que cada um trouxe de sua comunidade, e que permanecerá utilizando em seu meio social.
Por que estudar a língua padrão?
A variedade da língua que você fala não é a mesma que é ensinada na escola. É dever da escola ensinar a norma culta, empregada em situações formais. Por ser a mais valorizada socialmente, o domínio da norma culta é fundamental para a vida profissional, a ascensão social, a participação na vida político-social e cultural do país, o desenvolvimento do pensamento abstrato e a compreensão dos variados tipos de textos.
A língua padrão deve ser considerada como um recurso a mais. O seu professor não segue rigorosamente em sua própria fala a gramática que ele ensina. Além disso, a língua está em constante mutação e muitas regras gramaticais exigidas em concursos, prescritas nas gramáticas, em programas de televisão ou artigos de jornais estão defasadas e já não seguidas pela maioria dos falantes cultos.
Infelizmente, os vestibulares tradicionais tratam as variantes linguísticas quase sempre sob o ponto de vista do “certo” e do “errado”, considerando que o falar “correto” é apenas aquele que segue as normas da linguagem culta e formal. Os vestibulares inovadores e as provas do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) exploram as variantes linguísticas com mais inteligência, observando a sua expressividade, as intenções de caracterização de personagens e situações, os efeitos humorísticos etc.
Imagem: https://mscamp.wordpress.com/files/2008/10/variedade-linguistica11.jpg
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